O Hábito Mais Importante da “Data Driven Culture”

Os dados que sua empresa gera todos os dias têm um enorme valor. Tanto é que dizem por aí que os dados são o novo petróleo, pois são refinados através de algum processo definido e se tornam insumos para melhorar os resultados da empresa.

Da mesma forma que os derivados de petróleo são encontrados em todos os lugares, os dados também podem ser usados em diferentes contextos de uma empresa. Por exemplo, nas atividades de planejamento, na análise da causa raíz dos erros, na busca de oportunidades para o aumento das vendas, no estudo de tendências de mercado para a criação de novos produtos, entre muitos outros ambientes e cenários.

Uma ideia puxa outra e assim raiou a ideia da cultura de ação baseada em dados, ou Data Driven Culture, onde os dados passam a ser o motor da ação empresarial, o direcionador que a impulsiona. Ou seja, é recomendado que as empresas criem uma cultura de análise de dados no seu trabalho cotidiano. É essa cultura de agir baseado em dados que vai abrir novas oportunidades, vai reduzir riscos e incrementar a qualidade do que a empresa entrega.

De maneira geral, quando um executivo ou líder conclui que ele precisa que sua organização atue sobre fatos, o caminho para esse objetivo passa por estimular essa Data Driven Culture, e é sobre isso que quero falar neste ensaio.

Data Driven Culture

Nomes carregam ideias que vão muito além de seus significados. Nossos cérebros precisam trabalhar dobrado para ler um nome em inglês, que em geral possui um significado facilmente apreensível, e dar a ele um sentido em nossa vida. Por isso é importante traduzirmos essas expressões quando pudermos.

Se traduzirmos ao pé da letra, Data Driven Culture perde completamente o sentido:

  • Data: Dados,
  • Driven: Dirigido, orientado por,
  • Culture: Cultura, fenômeno que engloba conjunto de tradições, costumes e valores de um grupo, transmitido via aprendizado em sociedade.

A própria Norma ISO 9000, que trata dos fundamentos e vocabulário dos sistemas de gestão da qualidade apresenta como 6º Princípio da Qualidade:

DECISÕES BASEADAS EM FATOS: Decisões tomadas com base na análise e avaliação de dados e informações são mais propensas a produzir resultados desejados. – NBR ISO 9000:2000 – Sistemas de gestão da qualidade: Fundamentos e vocabulário. ABNT, 30/09/2015.

Portanto, na minha opinião, uma interpretação mais útil dessa expressão seria:

Data Driven Culture = O Hábito da Ação Baseada em Dados.

Queremos destacar com essa interpretação que as empresas não são dirigidas por dados, mas as pessoas usam dados para dirigir suas empresas. Afinal, é isso que é uma Cultura: aquilo que você carrega, os hábitos que internalizamos a ponto de se tornarem nossos, um bem coletivo que une indivíduos em torno de crenças e valores em comum.

O Hábito Faz o Monge?

Ok, então todos estamos cientes de que:

  1. Dados são importantes,
  2. Precisam estar na origem das ações de nossas empresas, e
  3. Sem basear nossas decisões em fatos, extraídos de dados, estamos brincando com a sorte – e uma hora podemos perder de lavada quando as consequências forem irreversíveis.

Mas e aí? De todo esse palavreado, qual caminho um executivo deve tomar para desenvolver uma Data Driven Culture?

Não tem segredo, é uma coisas simples e direta:

Não devemos discutir resultados ou qualquer iniciativa sem antes “abrirmos” os dados.

Quero dizer, o primeiro hábito que a empresa deve internalizar é carregar suas análises e seus dados para toda reunião, enfiá-los em todas as apresentações e relatórios. Não podemos nos basear somente em opiniões, ponderações ou suspeitas ou intuição! É preciso haver sempre a voz dos dados em tudo que fazemos se queremos explorar a abundância de oportunidades da Nova Economia Digital.

E é esse o hábito mais importante?

Nem de longe.

Ver Para Crer

O segundo hábito que a empresa precisa desenvolver, uma vez que tenha assimilado o primeiro (dar voz aos dados em todas as conversas), é a COBRANÇA!

Se você recebeu um problema para resolver, sua experiência e intuição formam a base de sua capacidade de análise. O conhecimento que você acumulou, sua percepção da situação, sua visão 360 – isso e muitos outros fatores vão compor o seu processo de análise e decisão.

Mas nada disso vai te salvar de uma decisão arriscada se você não receber dados que possam ser usados para corroborar ou contestar as hipóteses que serão feitas no processo de buscar a solução de um problema.

Em outro exemplo, se você é um executivo, constantemente você precisa reavaliar sua estratégia e repensar as táticas, afinal estamos imersos em um mundo cada vez mais VUCA – Volátil, Incerto, Complexo e Ambíguo, digital e abundante! Essa reavaliação não existe sem dados. Relatórios de resultados, apresentações e painéis são um substituto de baixa qualidade para o dado no duro, o hard data.

Nessas situações, o responsável pela ação precisa estar de posse de dados suficientes, em formato apropriado para avaliação mais profunda. Nem todos entendem isso, e nem todos querem que isso seja uma realidade. Lembre-se: nem sempre agimos no melhor interesse de nosso empregador, mas sim de nossos interesse em permanecer empregado.

Crie em si mesmo o hábito de cobrar dados juntos de tudo que chega para sua consideração, para que você possa ver o trabalho feito antes de o assunto chegar às suas mãos. Não aceite relatos de segunda mão como a única fonte para seu trabalho: exija que os relatos não venham somente embasados em dados (o primeiro hábito), mas principalmente que os dados sejam parte dos entregáveis.

E esse, você suspeitará, é o hábito mais importante?

É importante sim. O mais? Nah. Nem passou perto.

Qual é o Preço da Pureza?

E qual hábito seria o mais importante para uma cultura de ação embasada em dados?

O papel aceita tudo – e elétrons aceitam mais ainda. Uma planilha de dados pode tanto conter registros trazidos dos sistemas, quando registros … ajustados, digamos. Pensar assim é uma atitude muito drástica, venenosa até. “Oh, puxa, todos querem me enganar”. Não devemos ir tão longe.

Erros em dados e em sua interpretação podem surgir naturalmente, sem nenhuma malícia envolvida. Basta uma dedada errada no teclado para uma projeção de vendas ser distorcida, ou para um ROI calculado condenar um projeto a um fim prematuro. Isso quando um simples e inocente viés de confirmação não leva a conclusão em uma direção questionável.

De nada adianta exigir que dados sustentem as conclusões (primeiro hábito) ou que estas sejam acompanhadas dos dados quando são entregues (segundo hábito) se o que se produziu for inquestionável. Se você não pode questionar o resultado, esse resultado não tem valor, pois não passaria de um dogma.

Para que as ações embasadas em dados trabalhem a favor de sua empresa e de seus resultados, os dados precisam ser desafiados, as conclusões precisam ser questionadas.

Ou seja, é preciso cultivarmos o hábito do ceticismo.

E esse é o hábito mais importante. Sem ele, todo o restante não passaria de uma pantomima, um balé corporativo, um culto ao avião cargueiro dos mares do sul.

Conclusão

Dados não são o novo petróleo. Essa metáfora é bacana e serve para vender software, consultoria, projetos, etc. Dados são luz, a luz que podemos acender para examinar a realidade. Desafiar uma metáfora com outra não muda o fato de que toda empresa que deseja crescer e melhorar precisa estar atenta ao que acontece em seu dia-a-dia e, para isso, ela precisa coletar e empregar dados em tudo que faz.

Esse “empregar dados em tudo que faz” é o cerne da Data Driven Culture. Isto é, do hábito da ação embasada em dados. Esse hábito, que é algo etéreo, que se sustenta sobre hábitos mais mundanos, mais concretos, como:

  • Exigir que toda discussão inicie com dados, para dar voz à realidade,
  • Exigir que os dados façam parte dos entregáveis, especialmente quando sobem na hierarquia ou servem de insumo para o próximo trabalho na cadeia de valor, e
  • Não terceirizar a certeza. Ou seja, ser cético em relação aos dados e às conclusões associadas.

Destes três hábitos, que não surgem naturalmente mas precisam ser desenvolvidos por meio das lideranças, o último é o mais importante. Porquê? Porque é através da revisão e da contestação que usamos nosso conhecimento e experiência para agregar valor às ações. Se abrirmos mão desse ceticismo saudável, abriremos mão de colocar nosso talento, energia e conhecimento a favor da empresa.

Mas, acima disso tudo, quando a análise chega para endossar uma ação, somos a última linha de defesa entre o risco desconhecido e o risco calculado. Batido o martelo, a sorte terá sido lançada, e sempre queremos a sorte ao nosso lado, não?

É como diz a música …

A dúvida é o preço da pureza, e é inútil ter certeza. – Humberto Gessinger, Engenheiros do Hawaii

É isso. Reforcem seus bons hábitos de dados, e até a próxima. 😉

Físico pela Unicamp, atuou como Gerente de Soluções no SAS, multinacional de BI, com mais de 20 anos de experiência no mercado de Inteligência de Negócios e soluções de dados. No SERPRO desde 2005, atuou na Superintendência de Desenvolvimento (SUPDE), no papel de Analista de Sistemas do Projeto de Data Warehouse Pessoa Física da RFB. Hoje está na área de gestão de produtos. Participou de várias edições do Pentaho Day, do Congresso de Tecnologia da FATEC São Paulo e na edição de 2015 da Latinoware, além de inúmeras palestras sobre BI, BigData, Data Warehouse, Agile BI e Data Culture. Autor e instrutor dos cursos "BI com Pentaho" e "Agile BI com Pentaho". Co-autor do primeiro livro sobre Pentaho em Português, "Pentaho na Prática", autor do livro "Fundamentos de Inteligência de Negócios". Minha imagem de capa, de Stefan Keller, disponível em Pixabay é um texto sobre a figura de UFO ameaçador - como são os dados para as idéias pré-concebidas.

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